segunda-feira, 9 de abril de 2012

Shigeru Ban - 30 de março de 2012


Aconteceu no Rio de Janeiro, no Espaço Tom Jobin a 2ª edição da Arq. Futuro, um evento semestral que traz grandes nomes do cenário arquitetônico mundial para compartilhar suas experiências e opiniões e analisar os papéis da arquitetura contemporânea, em suas abordagens artística, social e ambiental.

        Shigeru Ban é um grande arquiteto japonês e professor da Universidade de Kioto. Além de suas pesquisas com papéis, madeiras e têxteis, o que mais chama atenção em sua arte é a sua busca por soluções para situações emergenciais. 

Sempre muito simpático, em sua palestra, nos fez um breve resumo da sua trajetória que tentaremos transcrever aqui.


Formado pela Cooper Union School of Architecture em 1984, deu início a apresentação com a Axis Gallery, Tokio, Japão, 1986, uma exposição temporária projetada para Alvar Aalto, seu arquiteto predileto, que tem como marca registrada o uso da madeira em seus projetos. Mas como criar um galpão em madeira para uso temporário? Acreditando que seria um desperdício, além de caro, deu início a seus testes com o papel reciclado, criando o teto, parte do piso e da parede usando uma estrutura de tubos de papelão, aqueles que sobram quando utilizamos todo o rolo de papel higiênico, papel toalha, papel alumínio, etc.

A estrutura se mostrou resistente para tal função e esteticamente surpreendente, pois sua cor semelhante a da madeira ajudou a compor muito bem.

A partir daí começamos a entender sua forma de trabalhar: Consciente e sustentável.


Outro arquiteto que também lhe serviu de exemplo foi Mies Van Der Rohe, pois dele partem duas fortes inspirações.

Uma delas foi baseada na Farnsworth House (1950), quase sem paredes e divisórias. Criou um sistema de casas pré-fabricadas em compensado e laminado de 25mm com encaixe edentado, onde as paredes são os próprios móveis e o telhado se apoia nelas.

A esta edificação, foi dado o nome de Furniture House 1, de fácil montagem, baixo custo e ideal para locais onde há a possibilidades de furacões, pois espera-se que a casa se despedasse e seja o mais leve possível na hora da queda para não correr o risco de machucar ninguém. Ela foi montada em 1995 no Lago Yamanaka, Yamanashi, Japão.




Seguindo o raciocínio de evitar o desperdício, Shigeru projeta o Nomadic Museum, inaugurado em 2005 em New York, para a exposição fotográfica Ashes and Snow de Gregory Colbert. Com 152 conteiners, dispostos num padrão “tabuleiro de xadrez”, o que ajudou a economizar e deixar a edificação mais “leve”. A exposição evita gastos com o transporte da estrutura, pois os containers são alugados nos locais onde acontecem a exposição, ou seja, toda vez que as obras viajam, os containers ficam e alugam-se outros. A exposição nômade já esteve em Santa Mônica, Califórnia em 2006, Cidade do México em 2008, etc.






Na sua segunda inspiração em Mies Van Der Rohe, Shigeru projetou a Curtain Wall House em 1995, Irabashi, Tokyo, Japan, mas atento a maior falha da casa de Mies, criou uma cortina que envolve a casa, assim, em momentos de maior privacidade, o proprietário se “esconde”, e nos dias onde a opção é se abrir para o mundo e deixar passar o calor do sol, as cortinas se abrem. Como uma segunda opção usou a venesiana de vidro, pois tradicionalmente em Tokyo, podemos observar uma grande quantidade de casas com espaços completamente abertos, mas esta característica funciona bem no verão e esfria muito a casa no inverno, além de deixar passar os mosquitos que importunam os moradores da casa. Assim como as cortinas, as venesianas são flexíveis e controlam a circulação de ar, e de mosquitos, diminuindo o uso de recursos artificiais.



Para contrastar bem a transparência visual e a transparência física, a Picture Window House feita em 2002, Izu, Shizuoka, Japan, exemplifica os dois conceitos numa estrutura que é basicamente feita por dois retângulos sobrepostos e simétricos, para que a disputa seja imparcial, aliás, o que está em jogo é a magnífica vista do Oceano Pacífico.



Aproveitando o conceito de simetria, bastante utilizado por Shigeru, a House Two Fifths, 1995, Nishinomiya, Japan, foi dividia em cinco retângulos iguais dos quais três estão ao “ar livre”.





Convidado pelo grupo Swatch para projetar um prédio para oito lojas de relógio, localizado na rua Nicolas G. Hayek, teve como premissa que a sede da Swatch estivesse de frente para rua. Mas se perguntou por que só uma loja estaria de frente para rua, se o centro de Ginza, Tokyo, possui um dos m² mais caros do mundo?

Como resposta projetou a edificação de modo que todas as lojas estivessem de frente para a rua, dispondo-as em diferentes alturas. Para resolver o problema das alturas, disponibilizou um elevador para cada loja que se encontra embaixo da mesma, de frente para sua vitrine.

Desta forma criou um vão público, a princípio monótono, mas que se encheu de vida com um jardim vertical. Gostou da idéia? Leiam mais sobre o assunto na postagem Subindo pelas Paredes do dia 9 de março de 2012.



Outra construção apresentada foi um condominio em Chelsea, NY, 2007, com oito apartamentos duplex onde utilizou venezianas de metal perfurado para dar privacidade aos moradores além das venezianas de vidro para controlar a ventilação.




E vocês devem estar se perguntando: Onde estão as famosas esculturas estruturais de Shigeru que ainda não foram mencionadas no post? Começamos com o Atsushi Imai Memorial Gymnasium, 2002, Odate, Akita, Japan.

O maio desafio desta estrutura foi criar uma cúpula oval tridimensional com 20m em seu maior diâmetro, em madeira laminada, para suportar seu próprio peso e o peso da neve no inverno, por isso a forma de “arco”, para que a neve escorra e não acumule.

Os arcos ao longo do lado mais longo são definidos em um ângulo para que trabalhem como membros de treliça e os arcos do lado mais curto são colocados para formar a cúpula e dar sustentação ao mais longo.





Outro exemplo de telhado, que marcou bem o trabalho de Shigeru, é o do Pompidou Museum, 2010, Metz, Lorraine, France, que foi inspirado no chapéu chinês e baseou-se na forma exagonal. Para Shigeru, também lembra o mapa da França. Sua estrutura foi feita de madeira e coberta por uma membrana translúcida de papel.

A escolha da construção foi feita através de uma competição, da qual foi o vencedor, e parece se orgulhar tanto do projeto que o escolheu com base para seu escritório temporário, no telhado do museu, tendo como “desvantagem”, brinca, que seus clientes precisam visitar a exposição antes de encontrá-lo.

Para nós, outro ponto alto deste projeto são as paisagens icônicas da cidade de Metz emolduradas nas paredes.












Seguindo o conceito dos exágonos criou o telhado da Haesley Nine Bridges Golf Clubhouse, 2010, Korea, feito em parceria com o arquiteto KyeongSik Yoon.

Conta ele, não ter tido inspiração para o projeto, pois não entende muito de golf, mas acabou se baseando no “T”, que é o apoio para a bola, criando as colunas que sustentam o arco de compressão formando o teto.








Neste momento, Shigeru contou que em 1990 ainda não tinha permissão do governo para construir com estruturas de papelão, mas que havia uma certeza muito grande de sua eficácia, pois liderou estudos para deixá-lo a prova d’água e de incêndio, então fez sua própria casa, e assim conseguiu a legalização.

A idéia para esses estudos partiu de sua preocupação com o lixo gerado nas obras e no desmonte das mesmas, caso fossem utilizadas para uso temporário, e que não inventou nada, só reinventou, utilizando os tubos para outra finalidade. Esta é sua busca constante para não depender de tecnologias.

Questionado sobre a durabilidade e resistência do material comparado ao concreto, respondeu que duram muito tempo. Até hoje não teve nenhuma notícia de que algum de seus prédios tenham tido qualquer tipo de problema, e que a resistência é surpreendente, permite criar muito. Comparando, pode ser até mais resistente, pois em caso de terremoto uma parede de concreto desaba e a de papelão apenas se desloca.

Outro ponto alto da palestra foi quando contou se desapontar com a profissão que trabalha, quase sempre para privilegiados com dinheiro e poder. Até o momento não haviam arquitetos pensando em casas para regiões afetadas por catástrofes naturais e passou então a dedicar-se também a elas, mas paralelamente continua construindo grandes obras: todos gostam de construir monumentos! Brinca.`

A exemplo disso temos dois milhões de refugiados pela guerra civil em Ruanda, 1994, que necessitavam de abrigo contra o frio, a ONU passou então a fornecer uma folha de plástico por família, que precisava cortar árvores e montar o “esqueleto” da casa a ser encoberto por ela, 1º problema: o desmatamento começou a afetar o ecossistema da região, solução: passaram a doar além do plástico, uma estrutura em alumínio, 2º problema: ao invéz de utilizar corretamente, os refugiados começaram a vender o alumínio, continuando desabrigados, solução proposta por Shigeru Ban: estrutura com tubos de papelão.

Podemos nos sentir desconfortáveis com esta solução, pois uma casa feita de papelão coberta por plástico não é uma casa digna, mas esta é uma questão social, pois a ONU precisa garantir a sobrevivência deles,  mas não quer que se acomodem com a situação, até porque a região é bem valorizada e os refugiados são vizinhos a projetos de Tadao Anda, Frank Gery,...


O terremoto de Kobe, 1995, destruiu a cidade e o governo ofereceu moradias mal localizadas que não foram bem aceitas pela população, assim sendo, Shigeru construiu pequenas residências em papelão fazendo a fundação com engradados cheios de areia; mas queria também construir a igreja vietinamita local, por considerar ser importante neste recomeço para que as pessoas não perdessem a fé.

O padre, a princípio, rejeitou a idéia, mas cedeu quando condicionou a construção ao angariamento de verba conseguido por Shigeru que recrutou também um grupo de voluntários para a construção (que é sempre seu método de trabalho com catástrofes naturais, ter um grupo de voluntários fixos que vão ao local e treinam os voluntários locais para que ajudem na reconstrução da região).

A igreja de papelão foi tão bem aceita que após a reconstrução da igreja local, foi remontada em Taiwan.






Na reconstrução das casas destruídas pelo terremoto da Turquia em 2000, Shigeru teve a colaboração também das crianças, pois catavam papel e enchiam os tubos de papelão para deixar a casa um pouco mais aquecida.

A problemática do local foi não ser costume da população o consumo de cerveja, portanto, foi difícil encontrar engradados para servir de piso (apenas de Coca-Cola que preferiu não utilizar) e sobre eles, utilizou esteiras do artezanato regional como piso.


Terremoto de Chengdu, China, 2008, projetou a escola municipal temporária que aguardaria aproximadamente um ano pela construção da escola efetiva, mas não teve autorização do governo para construir, pois rejeitavam o apoio estrangeiro, assim sendo, utilizou-se de sua estratégia recrutando voluntários locais e obteve o alvará do governo para construir.

Esta escola temporária fez tanto sucesso entre as crianças, que depois de construção da escola efetiva, elas continuaram visitando a antiga para brincar.



Terremoto em L’Áquila, 2009, Itália, uma cidade famosa pela música que teve destruída suas salas de concertos, sem elas, os músicos da cidade se sentiram prejudicados e passaram a frequentar as cidades vizinhas. Para resolver o problema, conseguiu que o governo japonês apoiasse Berlusconi e criou paredes de andaimes com sacos de areia para dar acústica, envoltas por cortinas vermelhas que reforçaram ainda mais a acústica e deixou o visual mais interessante.







No Haiti em 2010, contou que a parceria estudantes voluntários e voluntários locais deu tão certo que conseguiam construir 50 casas por fim de semana.


Fukushima em 2011, o governo disponibilizou um ginásio para todos os desabrigados, onde não tinham a menor privacidade. Como solução foram feitas divisórias em papelão onde podiam ser amarrados panos opacos  para das privacidade, ou mosquiteiros. Com a vantagem de poder aumentar o tamanho do compartimento utilizando dois ou mais se a família for grande.



Também para os desabrigados de Fukushima projetou estruturas de containers para abrigar 190 famílias e espaços comunitários, como por exemplo, a Biblioteca Municipal.







Perguntado sobre os desabrigados brasileiros, Shigeru não demonstrou interesse, respondeu que temos aqui um problema social e não ambiental, que é o seu foco. Diz que teria um enorme prazer em ajudar, se fosse o caso, mas que torce para não precisar vir por este motivo, demonstra interesse em construir para o governo, particulares, hóteis temporários para a alta demanda que virá na copa.

Logo após o término da palestra a ministra do meio ambiente, Isabela Teixeira, convidou o arquiteto para participar de um programa-piloto onde a idéia é aproveitar a madeira apreendida pelo Ibama na Amazônia para construir escolas públicas e centros comunitários. A idéia foi super aprovada por ele.

Estamos todos ansiosos pelos seus projetos aqui no Brasil!

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